sexta-feira, 22 de novembro de 2019

BRINQUEDOTECA E A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS POPULARES BRASILEIROS

Diego Emanoel Veis Bentancourt; Wanessa Pinto de Lima; Mariana Enderle

Resumo: O fato de os contos tradicionais serem um dos meios de comunicação mais antigos de veiculação de informação de um povo, que afirma e reafirma sua cultura por intermédio deles é sem dúvidas significante. Instigado em estudá-los no contexto social, mais precisamente, em uma brinquedoteca, com crianças de faixa etária entre quatro a seis anos, elaborou-se uma oficina de contação de histórias, batizada de: “Hora do Conto”. A ideia principal foi relacionar os contos e recontos das mais variadas culturas de nosso país com as vivencias presentes nos encontros. Partindo da observação direta dessas situações aliadas ao referencial teórico encontrado foi possível delinear o trabalho que parte dos contos populares brasileiros e vai de encontro ao papel social da infância, observou-se então que estes corroboram para o desenvolvimento social, cognitivo e emocional.


Palavras-chave: Contos populares, Brinquedoteca, Infância   

INTRODUÇÃO 

É notório o desenvolvimento das percepções sociais das crianças que têm acesso a narrativas populares – arte milenar que perdura até os dias de hoje, que possibilita a aprendizagem por meio da fantasia (VELASCO, 2018) – nessa perspectiva didática que o presente estudo está inserido No intuito de pensar os anseios das culturas inseridas por meio dos contos e as engendrações resultantes da fusão delas com a bagagem empírica dos envolvidos na contação da história apresentou-se por meio de contos e recontos uma oficina de contação de histórias, denominada “Hora do Conto”, propiciando o contato de crianças com várias culturas por meio de histórias de boca a partir de livros previamente selecionados. Para análise recorreu-se a uma revisão bibliográfica que balizou a práxis do trabalho. Com a intenção de entender os contextos infantis recorremos a Florestan Fernandes (2004); descrever os contos de boca escolhemos Cristiane Velasco (2018); tratamos de brinquedoteca sob o prisma de Aline Sommerhalder, Fernando Donizete Alves (2013) e Antonia Cristina Peluso de Azevedo (2004). 

 BRINQUEDOTECA: OFICINA HORA DO CONTO 

O local de estudo escolhido para executar as experimentações propostas foi uma brinquedoteca“[...] nasceu no século XX para garantir à criança um espaço destinado a facilitar o ato de brincar.” (AZEVEDO, p.48, 2004), não obstante disso o objetivo da escolha desse local se dá pelo fato de ser o lugar mais favorável para as práticas pedagógicas no que diz respeito a contação de histórias dentro do contexto escolar pois “nas escolas, a brinquedoteca possui um objetivo pedagógico. Ela contribui para o desenvolvimento integral da criança e para a sua aprendizagem, tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental. (SOMMERHALDER; ALVES, 2011, p. 70).   Dada “a maneira como indagam e traduzem o mundo – via metáforas, símbolos e imagens – é muito próxima das narrativas míticas, por meio das quais os mais variados povos buscam explicar a origem das coisas” (VELASCO, p.17-18, 2018) pode-se notar a intrínseca forma como é vista a importância das narrativas para os povos, pois “estão presentes nas mais diversas culturas, sendo um importante elo entre os homens, pois tratam de aspectos fundamentais do humano: a capacidade de criar transformar, imaginar e sonhar.” (VELASCO, 2018, p. 19).  Na brinquedoteca, intitulada “Brinquedoteca: Vivências Significadas”, notamos, de acordo com Azevedo, o compromisso com  [...] desenvolver a imaginação, a criação e a expressão, incentivar a brincadeira do faz de-conta, a dramatização, a construção do pensamento, a solução de problemas, a socialização, a vontade de inventar, colocando ao alcance da criança uma variedade de atividades que, além de possibilitar a ludicidade individual e coletiva, permite que ela construa a sua própria percepção do mundo. (p.48-49, 2004)

Dessa forma, a brinquedoteca abre um espaço de suma importância, unindo a reflexão sobre os contos populares brasileiros e práticas lúdico-pedagógicas. Com essa comunhão de interesses objetivou-se a investigação sobre como as crianças captam e utilizam as informações passadas por meio das narrativas previamente selecionadas.

Todos os povos possuem seus contos, seus apólogos, as suas legendas e é admirável ver como essas tradições, no tempo e no espaço, se submetem ao fenômeno da transplantação sem perder o sinal de origem, e passam de um a outro país, logrando reviver em raças ou povos, as mais das vezes tão diferentes. (GOMES, 1965, p.11).

Essa transcendência que figura sobre os contos populares é mantida pelos interesses de determinado público que é responsável por sua reinvenção, Velasco cristaliza essa capacidade, segundo a autora “[...] essas narrativas abrigam o íntimo universal em que cada um pode se reconhecer à sua maneira – são metáforas da vida, pois trazem registros de sabedoria profunda, aspectos substanciais da jornada humana.” (2018, p.22). Por esse motivo nunca deixam de transcorrer e ter sua legitimidade enquanto propagadoras de lições valiosas para quem as narra e escuta. Essa interação é rica, pois para que esses contos sejam transmitidos implica a adição de elementos particulares do narrador.

O conto [tradicional ou popular] é antigo na memória do povo. Sua autoria é anônima, ou seja, não se sabe quem foi o autor da história, por isso ela é considerada uma criação coletiva – é de todos aqueles que a transmitem e recriam, imprimindo nela toques pessoais e uma identidade cultural (...) Sua linguagem revela marcas da oralidade, trazendo palavras e expressões do registro popular. (VELASCO, 2018, p. 22).

Gomes, ainda ressalta que “admitem os folcloristas em geral que os contos tradicionais são a forma ou a expressão primitiva e espontânea da arte.” (1965, p.11). Isso se dá pela historicidade que estas histórias trazem consigo ao longo dos séculos “tem eles o seu fundo de verdade, a sua poesia amplamente acessível ao sentimento comum de todas as raças, submetidos às leis da acomodação e da adaptação mesológica.” (GOMES, 1965, p.11).


CRIANÇAS E CONTEXTOS INFANTIS: RELAÇÃO ENTRE CONTOS E VIVÊNCIAS 

Parte-se para as experimentações com as crianças tendo consciência de que muito pouco se aborda sobre a construção cultural da infância, como agente portadora de mudanças, a infância parece continuar em estado de inercia quanto as engendrações políticas-sociais Faria, Demartini e Prado afirmam que

Os saberes construídos sobre a infância que estão ao nosso alcance ate o momento nos permitem conhecer mais sobre as condições sociais das crianças brasileiras, sobre sua história e sua condição de criança sem infância e pouco sobre a infância como construção cultural, sobre seus próprios saberes, suas possibilidades de criar e recriar a realidade social na qual se encontram inseridas. (2009, p. 22).
 O que buscou-se com a “Oficina Hora do Conto” foi transcender esse pensamento, ao contar e recontar histórias populares brasileiras incentivou-se a criação de hipóteses para cada situação-problema apresentada, os envolvidos, de posse das ferramentas orais dispensadas durante a narrativa deveriam propor saídas, lançar vozes sobre as vivências relatadas segundo suas próprias bagagens e dialogar entre si sobre essas questões.  Para isso tomou-se como aporte balizador um estudo que está na vanguarda das pesquisas desse assunto “As Trocinhas de Bom Retiro” (1947), do autor Florestan Fernandes que foi precursor na investigação sobre as culturas infantis, “entendendo a criança como participante ativo da vida social, Florestan Fernandes observa, registra e analisa, como constroem seus espaços de sociabilidades, quais as características dessas práticas sociais, afinal, como se constituem as culturas infantis”(FARIA, DEMARTINI E PRADO, 2009, p.30).   Mesmo que a nossa prática não se efetive no contexto espacial da pesquisa de Florestan, não poderíamos deixar de captar para nós as principais ideias desse estudo, pois entendemos que a criança desde muito cedo vem agregando saberes linguísticos, logo:

Desde muito cedo, meninos e meninas possuem muitos conhecimentos sobre a narração de histórias. Aos dois anos a maioria usa convenções literárias em seus solilóquios, jogos e relatos (...) É um indício claro de que nessa idade as crianças já identificam a narração de histórias como um uso especial da linguagem. Essa consciência se desenvolverá até o reconhecimento das histórias como modo de comunicação, uma técnica socialmente para falar sobre o mundo real ou para imaginar mundos possíveis. (COLOMER, 2007, p.54).

 É através desse contexto, que os contos populares têm influência sobre as crianças, no momento que se constata que através deles, os pequenos começam a entender a necessidade da comunicação e que é possível entrar num mundo imaginário e visitar outros lugares fora da sua realidade, mas que também podem pensar ações e atitudes para agirem no mundo real  modificando o meio que estão inseridos e contribuindo para uma sociedade mais justa e mais humana.

CONCLUSÕES  

Tendo em vista os aspectos observados ao longo deste trabalho, pode-se destacar que os contos populares trazem em seu cerne a bagagem de muitos séculos atrás, aspectos sociais de vários povos e etnias e por isso são tão importantes para as crianças, corroborando para seu desenvolvimento social, cognitivo e emocional. Considerar a infância produtora de ações significantes no lugar que ocupa é imprescindível para que o conto não seja apenas uma narrativa vazia, mas, que possibilita o exercício do viver em plenitude, exercendo seu direito cidadão, consciente e capaz de elaborar saídas para seus dilemas de forma crítica e autônoma.

REFERÊNCIAS  

AZEVEDO, Antonia Cristina Peluso de. Brinquedoteca no diagnóstico e intervenção em dificuldades escolares. – Campinas, SP: Editora Alínea, 2004.

COLOMER, Teresa. Andar entre livros: a leitura literária na escola. trad. Laura Sandroni. – São Paulo, SP: Global, 2007.

GOMES, Lindolfo. Contos brasileiros. – 3. ed. – São Paulo, SP: Edições Melhoramentos, 1965.

FARIA, Ana Lúcia Goulart de; DEMARTINI, Zelia de Brito Fabri ; PRADO, Patrícia Dias Prado (orgs.). Por uma cultura da infância: metodologias de pesquisa com crianças. – 3. ed. – Campinas, SP: Autores Associados, 2009.

SOMMERHALDER, Aline; DONIZETE, Fernando. Jogo e a educação da infância: muito prazer em aprender. – 1. ed. – Curitiba, PR: CRV, 2011.

VELASCO, Cristiane. Histórias de Boca: o conto tradicional na educação infantil– 1. ed. – São Paulo: Panda Books, 2018.

Logo para Pedagogia criado pelo autor. 

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